sábado, junho 30, 2007

Ficção Científica dos Sonhos



Paprika” representa mais um fascinante tratado visual de Satoshi Kon sobre as conexões entre a Memória e a Identidade. Ambientado num futuro próximo, Kon apresenta-nos uma máquina de psicoterapia experimental que permite interferir nos sonhos e sanar problemas psíquicos, substituindo o relato oral pela intervenção directa do psicanalista. Quando a máquina é roubada por «terroristas de sonhos», uma perseguição frenética é despoletada, pois o que está em risco é a própria realidade. Num universo onde as regras se tornam voláteis, a linha que separa o real do onírico torna-se praticamente imperceptível. E é neste território recorrente que Satoshi Kon volta a desafiar a sua audiência. Ele é um batedor do subconsciente, das respectivas urgências e ânsias que regem por vezes o nosso quotidiano. Como animador, Kon compila os traços da vida real mais atentamente que muitos realizadores. Cada movimento, cada pedaço de lixo, cada agitação no vento, cada pestanejar é condensado sob elevada pressão, mas com uma fluidez perfeitamente adequada para deambular através de sonhos, tempo, fantasia e níveis da consciência. As permutas entre realidade e fantasia são fantasmagoricamente sublimes, reguladas pelas ilógicas peculiaridades que convertem abruptamente sonhos em pesadelos. Serão os sonhos fotografias do inconsciente que reflectem visões do que o espírito deseja? Existem inúmeras teorias sobre os maquinismos psicológicos e sobre as reacções sensoriais, mas a essência da nossa Humanidade permanece bem oculta no nosso âmago. É um território sagrado, o derradeiro refúgio que a ciência ainda não conseguiu enclausurar numa base de dados. Satoshi Kon desafia explorações na sua plateia, incita-a a testar novos conceitos, a esquadrinhar e reflectir sobre os territórios palpáveis e quiméricos que moldam a sua aura. Apesar do frenesim que se apodera da maioria dos momentos, “Paprika” não deixa de verter uma lágrima de nostalgia e remorso. Porque numa sociedade contemporânea que avança com descobertas tecnológicas que brotam como cogumelos, fica melancolicamente claro que se deixou algo enterrado para trás.

13 comentários:

  1. hum, parece muito interessante. não só pela tua discrição como pela imagem que acompanha o texto...:)

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  2. Kon é unico e exímio na sua arte. Ninguém o iguala. É pena que não se saiba nada sobre a estreia nacional de PAPRIKA (apenas integrou o Festival de Animação de Lisboa deste ano). Já lancei o peditório em variados blogs/sites relaccionados com anime/cinema nipónico/asíatico, mas enfim nda feito. msm assim, não deixo de perder a minha alta curiosidade pelo visionamento. Talvez a melhor obra de Kon, talvez.

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  3. Curse: É um filme soberbo.

    Miguel: Também esteve presente no Fantas. Mas para o rever neste país, só mesmo importando o DVD.

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  4. já tive a oportunidade de ver e é uma viagem do caraças :)

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  5. Agora fiquei com muita vontade de ver!!! não é justo!!! =))

    Adoro animação japonesa... E já há algum tempo que não vejo um bom filme destes. Ou série, para dizer a verdade! A falta de tempo e de fundos não ajuda nada!

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  6. Vi-o a semana passada. Fenomenal, delírio visual, fazendo o Alice no país das maravilhas parecer um desenho opaco. Remete também a The Matrix, com os diferentes mundos e fusões ilusórias...
    Até agora, o filme do ano ;)

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  7. Membio: Sem dúvida, essa é uma bela forma para o definir :)

    Betty: E este vale bem a pena. Oh se vale!

    Edgar: Este insere-se perfeitamente nos teus domínios ;)

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  8. Custa-me que lixo cinematográfico consiga encontrar espaço nas salas nacionais (estou-me a lembrar de Scary Movies ou The Mask2, por exemplo), enquanto que obras como este Paprika ou até mesmo o A Scanner Darkly sejam lançados directamente em DVD!

    Abraço

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  9. Como é que "Epic Movie" estreia nas nossas salas e "Hot Fuzz" é ignorado?!...

    Abraço!

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  10. Sem duvida muito bom este filme, vi-o quando esteve no festival de animaçao de Lisboa e revi-o a pouco tempo, com uma pequena ajuda da net :-)

    Nao sabia que ja tinha saido em DVD, ainda nao o consegui encontrar a venda...

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  11. Um filme que infelizmente irá passar despercebido a muita gente...

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  12. Também partilho a opinião de outros bloggers que já aqui comentaram, não percebo porque é que as redes de distribuição de filmes em Portugal estão constantemente a subestimar a inteligência dos espectadores... dar salas de cinema a filmes abaixo de medíocres como "Scary Movie" ou "Epic Movie" e limitar ao mercado de dvd's obras maiores é, no mínimo, lamentável. Nestas condições não é de todo supreendente que as práticas culturais da população (e, portanto, a sua cultura geral) sejam rudimentares.

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  13. Crónicas tristes do reino decrépito das nossas distribuidoras.

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